Ação busca o fim da superlotação em no máximo cinco anos, com a criação de um terço das vagas dentro de 12 meses após aprovação do plano diretor do sistema prisional.
O Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte (MPF/RN) e o Ministério Público do Estado (MP/RN) ingressaram na Justiça Federal com uma ação civil pública com o objetivo de obrigar a União e o Estado do Rio Grande do Norte a apresentar e executar um plano diretor do sistema prisional, que contemple a restruturação e ampliação das unidades através das medidas urgentes necessárias ao fim da superlotação nos presídios potiguares, onde há um déficit de aproximadamente 3.500 vagas.
A ação requer que o Governo Federal garanta o apoio técnico necessário, bem como transfira parte dos recursos já existentes no Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) para serem utilizados na melhoria e humanização do sistema no Rio Grande do Norte. O fundo conta atualmente com um saldo de R$ 2,7 bilhões, quantia que não vem sendo investida.
A peça assinada pelo procurador da República Victor Mariz e o promotor de Justiça Antônio de Siqueira Cabral também inclui um pedido liminar para que o plano diretor seja concluído em cinco meses pelo Estado, com a criação de 3.500 vagas em no máximo cinco anos, sendo que pelo menos um terço desse total deve estar disponível ainda no primeiro ano após a aprovação do plano.
O pedido de liminar também tem como alvo a União, objetivando que a mesma libere parte dos recursos do Funpen, necessários à implementação do plano diretor e a criação de novas unidades prisionais. A liberação dos recursos contidos no fundo atenderiam, inclusive, a uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que em 9 de setembro de 2015 determinou que os valores sejam liberados “sem qualquer tipo de limitação” para melhorar a estrutura das penitenciárias em todo o país, determinação que ainda segue sendo desrespeitada.
Os representantes do MPF e do MP/RN destacam a importância de o Governo do Estado elaborar o plano para nortear as ações a serem executadas, incluindo os projetos de construção de novas unidades, e até mesmo para estimar os recursos necessários, garantindo as verbas e possíveis contrapartidas para as obras. À União caberia analisar os dados e os projetos e viabilizar o repasse de recursos necessários, através do Funpen.
Calamidade - No Rio Grande do Norte, o estado de calamidade no sistema penitenciário foi decretado em março de 2015 e a situação ainda perdura. No entender do MPF e do MP Estadual, “a precariedade do sistema prisional do RN foi agravada ao longo dos últimos anos, gerada pela incompetência do Estado e por múltiplas falhas estruturais, mais especialmente pela superlotação das unidades prisionais, péssimo estado de conservação das mesmas, falta de manutenção, além da letargia do Executivo em proceder com a construção de novas unidades”.
O ápice do problema ocorreu em março de 2015, quando foram promovidos motins que resultaram na destruição parcial de 11 das 32 unidades existentes no estado. Muitas grades das selas foram arrancadas e, com os presos soltos dentro dos pavilhões, o número de fugas aumentou, assim como as mortes violentas entre os presidiários, que já somam 44 desde o início do ano passado.
O caos é agravado pela guerra entre facções criminosas que dominam o interior dos presídios. Esses grupos levam terror a toda a população, pois atuam também fora das unidades. Em 16 de março de 2015, cinco ônibus e uma viatura foram queimados e duas delegacias atacadas por integrantes dessas facções que se encontravam em liberdade ou foragidos. Só a depredação dos presídios, naquele período, gerou a perda de aproximadamente mil vagas e prejuízos de R$ 7,8 milhões.
Direitos humanos - o cenário constatado revela uma sistemática de constante violação de direitos humanos, registrando-se, somente neste ano, a morte de cerca de 20 pessoas dentro do sistema prisional. A situação caótica ofende a dignidade de presos, agentes penitenciários e reflete, diretamente, no aumento das estatísticas de criminalidade no Estado e na sensação de insegurança e medo que aflige toda a sociedade potiguar.
Para o MPF e MP-RN, “diante de cenário tão dramático e ofensivo aos direitos humanos”, a União e o Estado do RN devem ser conclamados pelo poder judiciário a adotarem as medidas necessárias para resolver a situação. Não há mais espaço para omissão"
Dinheiro - O Ministério Público reconhece que a União, a partir de 2009, firmou contratos de repasse com o Estado com o objetivo de construir, reformar e ampliar unidades prisionais no Rio Grande do Norte. No entanto, nenhum dos contratos foi executado pelo Estado, resultando na devolução integral dos recursos federais e na perda de 1.500 novas vagas. Por esse motivo, uma ação de improbidade foi impetrada pelo MPF contra o Estado e a ex-governadora, Rosalba Ciarlini. Por outro lado, o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) acumula um saldo de R$ 2,7 bilhões, recursos federais que não estão sendo investidos na melhoria do sistema prisional.
Fugas e déficit – De acordo com a ação, somente entre janeiro a maio de 2016 foram registradas 34 fugas nos presídios potiguares, resultando em 206 fugitivos. Informações da Secretaria de Justiça e Cidadania, encaminhadas ao MPF no último dia 16, apontam que há atualmente 7.812 presos, para uma capacidade que seria de 4.466. Um déficit de 3.346 vagas. “A população norte riograndense não pode arcar indefinidamente com os custos sociais da ineficiência administrativa e de uma crise financeira que não apresenta horizontes de melhora em um curto espaço de tempo.”
O procurador e o promotor apontam que diversas tentativas já foram feitas - seja pelo Conselho Nacional de Justiça, seja por entidades como o Fórum Permanente de Discussão do Sistema Prisional do RN, ou pelo próprio MP - para pressionar o governo local a adotar soluções. Foram expedidas recomendações, propostos e assinados acordos, mas nenhuma medida extrajudicial deu resultados, daí a necessidade de cobrar soluções através da Justiça.
A ação tramita sob o número 0804264-12.2016.4.05.8400, perante a 5ª Vara Federal.